EICPAC: 60 ANOS A FORMAR PILOTOS DE CAÇAS

Texto: Paulo Mata
Artigo publicado no jornal Take-Off de abril de 2013


T-33A Shooting Star da Esquadra 20 na BA2 - Ota

Sendo a mais antiga sub-unidade da Força Aérea em actividade, a história da hoje designada EICPAC, quase se confunde com a do próprio ramo aéreo das Forças Armadas portuguesas, estando também intersticialmente ligada ao advento da era da aviação a jacto, na ocidental Pátria Lusitana.
A sua história contudo começa ao contrário do que geralmente acontece: foi a recepção das aeronaves que levou à formação da unidade de voo e não o contrário. As aeronaves foram os Lockheed T-33A Shooting Star, e a unidade, a Esquadrilha de Voo Sem Visibilidade (Esquadrilha VSV). Integrada na Esquadra 20 que operava também os F-84G Thunderjet, tal como os T-33 recebidos dos EUA ao abrigo do Defence Mutual Assistance Programme em 1953. Portanto apenas um ano após a criação oficial da Força Aérea enquanto ramo independente. 
A missão: ministrar instrução de voo por instrumentos sob capota e transição para os caças F-84, que não dispunham de versão bi-lugar. À medida que foram recebidos mais aviões (T-33 e F-84) a Esquadrilha acabaria por “independentizar-se” já em 1955, como Esquadra 22, continuando a operar na BA2 – Ota, onde estavam então centralizados os jactos da FAP. A missão é também readaptada às necessidades, como era então a transição de pilotos com experiência de caças convencionais (a hélice) para os caças a jacto. Do syllabus (plano curricular) constavam cerca de 40 horas de voo, compreendendo voo básico, acrobacia, formação, instrumentos, navegação e voo nocturno, após o que os pilotos transitariam para os F-84. Nas fileiras da Esquadra 22, encontravam-se então como instrutores, os melhores e mais qualificados pilotos militares nacionais.
Com o fim dos cursos de transição no ano seguinte, a missão da Esquadra foi novamente readaptada, uma vez que deixava de se tratar de uma unidade de conversão e regressava à instrução de voo, passando por isso a designar-se Esquadra de Instrução Complementar de Pilotagem (EICP). Já em 1957, a Esq. 22 e os T-33 seriam relocalizados para a BA3 em Tancos e em 1958 renomeada Esquadra de Instrução Complementar de Pilotagem de Aviões de Caça, que se mantém até aos dias de hoje. O curso então compreendia já 80 horas de voo, com aumento das matérias teóricas e reajustamento do syllabus.


O RT-33 n/c 1916 que mais longa vida teve na FAP
Em 1960, de regresso à BA2, e com a aquisição dos F-86F que assumiram as funções dos F-84 enquanto principal caça da Força Aérea, a Esquadra 22 incorpora os cerca de 40 F-84 então operacionais, provenientes das extintas Esquadras de caça 20 e 21. Passando a funcionar de novo como uma Esquadrilha dentro da Esq. 22, os T-33 manteriam as funções de instrução, enquanto os F-84 efectuariam a conversão operacional dos pilotos destinados aos F-86. O advento das guerras ultramarinas no entanto, impediriam que tal viesse a acontecer, e os único pilotos a realizar o curso de conversão sem F-84, acabariam por seguir com os mesmos aviões para Angola, não chegando a transitar para os F-86. A Esquadra 22 voltava a operar apenas os T-33, então em três versões diferentes, de acordo com as diversas tranches recebidas desde 1953: T-33A, T-33AN e RT-33.
Até Novembro de 1974 quando a Esquadra foi relocalizada para a BA5 em Monte Real, poucas alterações houve relativamente ao funcionamento do curso, então com 90 horas de voo. 

Um dos cinco T-33AN Silver Star

Relativamente às aeronaves contudo, os cinco T-33AN abandonariam ainda em 1961 a EICPAC, para servir na Esquadra 51 em Monte Real: problemas  por isso de ordem logística e operacionais, devido a diferenças profundas nos sistemas mecânicos, de comunicações e instrumentos entre as duas versões, ditariam o seu afastamento, não obstante se tratar de aeronaves com performances bastante superiores aos T-33A, que eram contudo em muito maior número. Os T-33AN seriam definitivamente retirados de serviço em 1970, enquanto a Esq. 22 recebia por sua vez um lote de 10 T-33A em 1968, provenientes de esquadras americanas na Europa (RFA e Reino Unido).

Linha da frente de T-33 em Monte Real

Em 1977, com a reestruturação das unidades da FAP e respectiva nomenclatura, a EICPAC ganha finalmente a designação Esquadra 103, que se mantém até aos dias de hoje. Em 1980, passa a operar novamente duas Esquadrilhas, com a incorporação de 12 T-38, provenientes da Esquadra 201, quando esta foi extinta com o fim das actividades dos F-86. Dá-se também a curiosidade dos “Caracóis”, como é também conhecida a Esq 103, operar a partir de então, o mais rápido e único avião supersónico da Força Aérea. 

T-33 e T-38 conviveram mais de uma década na Esq. 103

Até 1987 não haveria mudanças de vulto, sendo nesse ano novamente transferida de base, passando então a operar a partir da BA11 em Beja. O syllabus do curso seria uma vez mais alterado, tornando-se o mais completo de sempre em T-33A, ao atribuir maior ênfase à fase táctica. A partir de 1988 e com a desactivação progressiva que começou a afectar a frota T-33, foram os cursos transitando para o T-38. A Esq 103 operaria o T-38 por pouco tempo mais, depois da retirada do T-33 em 1991, já que também os T-38 seriam desactivados em Junho de 1993. Novo capítulo se iniciaria na história da Esquadra, com a chegada dos Alpha Jet no horizonte.
Desta última fase, não desenvolveremos muito, uma vez que a mesma foi coberta no recente número 162 do Take-Off, de Dezembro de 2012, por ocasião da comemoração das 50.000 horas da frota Alpha Jet.

Formação mista de T-38 e Alpha Jet (ainda) alemães baseados na em Beja

Podemos todavia sintetizar, que tal com dantes, a Esquadra 103 mais uma vez se reinventou, para se adaptar à nova aeronave, passando a ministrar a partir de Novembro de 1993 um curso muito mais extenso, em virtude da aeronave alemã permitir a utilização de armamento. De assinalar também ainda neste período, a patrulha acrobática Asas de Portugal que cumpriu várias temporadas sustentada nos pilotos e aeronaves da Esq 103.


 As duas pinturas de usadas pelos Alpha Jet da Esquadra 103

Em 2013, quando se cumprem 60 anos da criação da Esquadrilha de Voo sem Visibilidade, a Esquadra comemorou a efeméride em cerimónia militar realizada no dia 28 de Fevereiro na BA11. Nela estiveram presentes altas individualidades da Força Aérea, técnicos e inúmeros pilotos que passaram pela EICPAC, ao longo destas seis décadas.
Quando se pergunta a quem a ela pertenceu, acerca da aeronave preferida dentre as que passaram pela EICAPAC, as opiniões dividem-se e são visivelmente mais baseadas no coração do que na razão. Consensual é no entanto, que qualquer delas prestou muitos e bons serviços à aviação militar nacional.

O SCh Almeida ainda na Esq 103 trabalhou nas três aeronaves voadas pelos Caracóis

Quanto ao futuro da Esquadra, é para já incerto, devido ao reduzido número de aeronaves operacionais (apenas seis) e à indefinição dos meios a operar a médio prazo. O presente, esse continua garantido pelo empenho dos seus elementos, herdeiros à altura do passado notável da mais antiga Esquadra da Força Aérea.


Grupo de antigos e atuais Caracóis no 60º aniversário da EICPAC 28/02/2013

4 Debriefing:

é isso mesmo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
João Almeida disse...

O meu muito obrigado ao PASSARODEFERRO pela distinção prestada.
Foram 34 anos de serviço sempre ligado à ESQ 103.

Os meus cumprimentos.

SCH João Almeida

(SCH = Sargento Chefe)

João Almeida disse...

Por favor apagar a publicação em nome de "é isso mesmo".
Por lapso publiquei sem reparar no nome que já lá estava por defeito.
Obg.
João Almeida

SIMÕES BALTAZAR disse...

Boa tarde
Ao rever esta fotografia e ao ver um ícone do F/86 e do T38 o Srg. Aj. Pil. Av. Jõao Roda, no meu tempo, o Alf. e Ten. Pil. Av. Taveira Martins, mais tarde Chefe do Estado Maior da Força Aérea... eu agradeço a Deus ter convivido com esta geração de Pilotos de Caça, mais tarde instrutores, que eram pilotos de eleição, militares irrepreensiveis e homens de qualidade excepcional... Tanto há a dizer desta geração que começa em 1952 com Tamagnini Barbosa a comandar a primeira esquadra de jactos na OTA, com os F/84, continuada co o F/86, com Moura Pinto como primeiro Falcão Mor, e o Fiat G91 R4 em Monte Real, primeira esquadra na Guiné com o Maj. Santos Moreira primeiro comandante de esquadra... Geração DOURADA sobre todos os aspectos, Militar, profissional e humano. Para os vivos um abraço bem apertado de muita saudade, especialmente para o RODA, para os que já partiram a minha sentida homenagem na pessoa do inesquecível Comandante Moura Pinto e do bom amigo Mónica
SIMÕES BALTAZAR ex Fur. Mil. OCART

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